Imagine que um cientista, destaque na criação de robôs na década de 1990, sofra uma traição e, muito desapontado, resolva recorrer à criogenia para escapar dos sentimentos provocados por aquela situação. O homem, congelado em 1995, desperta em 2025, 30 anos depois!
Esse é o enredo do filme japonês de ficção científica “Passagem para o futuro”, lançado em 2021 e disponível na Netflix. Parece algo muito longe da realidade, não é mesmo? Com frequência, o cinema e a teledramaturgia abordam assuntos como esse e projetam as mais impensáveis técnicas científicas aplicadas pelo ser humano.
Mas e se eu te contar que um ser humano gerado na década de 1990 atravessou a virada do milênio congelado, tal qual o protagonista do filme, e só nasceu agora, 30 anos depois? E não só um! Na verdade, dois seres humanos!
O caso real aconteceu nos Estados Unidos e foi possível graças à técnica de Reprodução Assistida de congelamento de embriões.
Longe de serem uma trama de ficção científica, os bebês Lydia Ann e Timothy Ronald Ridgeway, nascidos em 31 de outubro de 2022, viraram notícia em todo o mundo e, de acordo com essa reportagem publicada pela BBC, bateram o recorde do Centro Nacional de Doação de Embriões (NEDC, na sigla em inglês), como os embriões congelados mais antigos a serem utilizados na atualidade.
Gerados por um casal anônimo na década de 90, os embriões congelados foram doados para a NEDC em 2007, e descongelados somente agora para que o casal Rachel e Philip Ridgeway tivessem mais filhos (eles já eram pais biológicos de 4 crianças).
Mas como isso é possível?
Primeiro, é preciso entender como funciona o congelamento de embriões.
Embriões congelados em clínicas de reprodução humana têm origem no procedimento de Fertilização In Vitro, que se caracteriza pela fecundação do óvulo em laboratório, fora do corpo humano. Após serem cultivados em ambiente artificial, esses embriões podem ser congelados.
O processo da criopreservação passa pela vitrificação, que faz com que o embrião seja congelado muito rápido. Dessa forma, associado à temperatura muito baixa (aproximadamente -196°C), não há formação de cristais de gelo, o que vai preservar a qualidade do embrião.
A conservação nesse ambiente permite que os embriões fiquem armazenados por muito tempo e, quando descongelados, tenham grande possibilidade de apresentar a mesma forma, composição e qualidade de quando foram criopreservados.
Por que os embriões são congelados?
Embriões são congelados por diversos motivos. Um deles é a “sobra” de embriões nos procedimentos de Fertilização In Vitro.
De acordo com a legislação brasileira, mulheres com até 37 anos podem transferir de uma vez até dois embriões, enquanto mulheres com mais de 37 anos podem transferir até três embriões.
Durante o tratamento para realização da FIV, pode acontecer de a mulher liberar muitos óvulos e, consequentemente, ter mais gametas fecundados em laboratório. Como há limite para transferência, os embriões excedentes podem ser criopreservados.
Os embriões viáveis excedentes precisam ser congelados e os fornecedores do material biológico devem deixar registrado o destino a ser dado a eles. Podem optar por manter esses embriões congelados para usarem em outro momento. Como não há limite de tempo para deixar o embrião no laboratório, o casal pode pedir para descongelar apenas quando tomarem a decisão de terem filhos.
Além disso, há também a opção de doá-los ou, após três anos, se for vontade expressa dos pacientes, descartá-los.
A busca por essa técnica de reprodução assistida tem se tornado muito comum no Brasil. De acordo com o Relatório do Sistema Nacional de Produção de Embriões (SisEmbrio), feito pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), nos últimos 10 anos, o número de embriões congelados cresceu 255% no Brasil. Segundo o levantamento, a quantidade de congelamentos saltou de 32.181, em 2012, para 114.372, em 2022.
E quais são as regras para embriões congelados no Brasil?
No Brasil, existem várias regras para a criopreservação, principalmente em relação à destinação dos embriões congelados, todas elas dispostas na Resolução CFM nº 2.320/22.
Vamos listar aqui as mais importantes:
- Não há um limite de tempo para se manter um embrião criopreservado. Há casos de embriões congelados há mais de 30 anos
- Após três anos do congelamento, se for vontade expressa dos pacientes, os embriões criopreservados podem ser descartados. O mesmo prazo é usado para os casos de embriões criopreservados e abandonados. O Conselho Federal de Medicina – CFM considera abandonado o embrião cujos os responsáveis descumpriram o contrato preestabelecido e não foram localizados pela clínica
- É permitida a reprodução assistida post mortem, ou seja, em caso de falecimento de um ou ambos fornecedores de material biológico, o embrião que foi congelado ainda pode ser usado, desde que haja autorização específica, assinada em vida, para o uso do material criopreservado, de acordo com a legislação vigente
- O destino dos embriões congelados, em caso de divórcio, dissolução de união estável ou falecimento de um dos genitores ou de ambos, incluindo a doação, deve ser manifestado pelos pacientes antes do congelamento dos embriões
- Ao optarem pela doação do embrião, os fornecedores de material genético devem ter a identidade preservada, assim como a pessoa que vai receber o embrião
- Todas as clínicas, centros ou serviços onde são feitas as doações devem manter, de forma permanente, um registro com dados clínicos de caráter geral e características fenotípicas. Inclusive, na região de localização da unidade, o registro dos nascimentos visa evitar que um doador tenha produzido mais de dois nascimentos de crianças de sexos diferentes em uma área de 1 milhão de habitantes.
Quero congelar embriões. O que fazer?
Além de ser uma alternativa para as “sobras” dos embriões gerados por FIV, como explicamos acima, dentro do leque de possibilidades da reprodução assistida, o congelamento de embriões é também uma alternativa para o casal que deseja preservar a fertilidade de ambos.
Com embriões congelados, gerados a partir de gametas jovens, o casal pode pensar em ter filhos apenas no momento que desejarem, e planejar a gravidez no futuro, mesmo quando a capacidade reprodutiva da mulher estiver em queda.
Vale lembrar que todo procedimento em reprodução humana precisa de orientações médicas. Todo tratamento será individualizado!
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